16 de outubro de 2012

Elefantíase, O homem elefante e a revisão de textos



Elefantíase é uma doença horrível que obstrui a circulação linfática, principalmente nas pernas; por isso tem esse nome, pois a perna fica com a aparência de uma pata de elefante.

Não mudei de profissão, apenas quis iniciar essa postagem com essa informação, pois li um texto sobre o assunto, cujo final me deixou com alguma dúvida. O redator, ao finalizar o texto, escreveu o seguinte:


O revisor de textos deve ser uma pessoa bem informada não somente sobre a técnica do trabalho, mas também sobre atualidades, cultura, ciência etc. Como boa conhecedora cultural, percebi logo de cara que o filme O homem elefante não se trata de elefantíase, mas de outra doença. Veja o que diz a Wikipédia:

Como podemos ver, não foi elefantíase a doença do personagem do filme, mas Síndrome de Proteus. Quando um revisor de textos estiver com alguma dúvida sobre um determinado assunto, não são as gramáticas e os manuais de revisão que irão ajudar.

Um bom revisor, como disse, além de estar atento às correções ortográficas, morfológicas, sintáticas, técnicas dentre outras, deve prestar atenção em informações erradas que aparecem, como nesse exemplo. Por isso, devemos tomar muito cuidado para que deslizes desse tipo não passem para edição.

Revisão também é cultura.

10 de outubro de 2012

Vou estar defendendo o uso do gerúndio



"A gerência vai estar transferindo 3 mil reais de sua conta." Quem falar ou escrever uma frase assim atualmente corre o risco de ser ridicularizado. Culpa do gerúndio (e de sua junção com os verbos ir e estar), tachado de "assassino" do idioma por alguns gramáticos e formadores de opinião da mídia. Esse gerúndio é vítima da irritação dos usuários com seus maiores divulgadores, os operadores de telemarketing, que nos obrigam a sofrer para ter acesso telefônico a serviços de empresas. Mas será que o equívoco nesse processo é justamente o uso do gerúndio? Seria o gerúndio um erro gramatical da mesma ordem de falhas como "eu dispor" em vez de "se eu dispuser" ou "interviu" em vez de "interveio". E afinal de contas, o que é que o gerúndio está "assassinando"?

Para desprestigiá-lo, um observador afirmou que o gerúndio é uma firula desnecessária, um drible a mais na comunicação. Dizem, por exemplo, que "estar cuidando" tem o mesmo sentido que "cuidar". Mas todos nós temos o direito de usar ou não usar certa palavra, expressão ou locução. Qualquer idioma serve às intenções comunicativas dos seus falantes. Um determinado usuário pode dizer "vamos estar cuidando do seu caso" quando tem interesse em expressar continuidade, cordialidade ou polidez ao passo que outro falante pode desejar ir direto ao ponto, recorrendo à forma simples: "Vamos cuidar do seu caso" - que caracteriza um tratamento mais descomprometido ou "seco".

Outros falantes alegam que "vai estar transferindo" significa que repetidas transferências de dinheiro serão feitas pela agência bancária. É uma interpretação pessoal, que nada tem a ver com as regras da gramática. Além disso, qualquer cliente sabe que os bancos cuidam bem de suas contas e nunca vão esbanjar dinheiro fazendo transferências à toa. Ainda mais levando-se em conta a voracidade da CPMF.

A campanha contra o gerúndio, creio, é fruto de preconceito lingüistico sem embasamento numa pesquisa de campo entre os diferentes tipos de usuários de português em diferentes contextos. Pergunto por que os desafetos do gerúndio condenam a frase "Ele vai estar chegando na parte da tarde" quando os mesmos aceitam tranqüilamente a presença dos verbos modais: "Ele pode estar chegando, ele deve estar chegando, ele tem de estar chegando na parte da tarde"?

Subjacente à polêmica em torno da campanha de "cassação" do gerúndio, existe uma vontade geral de colocar o idioma numa redoma e não reconhecer que ele muda ao longo do tempo. O português da época de José de Alencar é diferente do português contemporâneo. Todas as línguas vivas inovam graças à criatividade dos seus usuários. Alguns críticos, com o intuito de proteger e manter o idioma estável, implicam com novos verbos, como "disponibilizar", novos substantivos como "descatracalização", novos adjetivos como "imexível" e "descuecado" ou até com estrangeirismos (sem equivalentes em português) como "dumping" e "ombudsman".

Para tentar banir o gerúndio do idioma, alguns observadores questionam as credenciais do mesmo e sugerem que ir+estar+verbo no gerúndio é resultado da invasão sintática do inglês. Essa crença não procede porque, em primeiro lugar, os falantes em questão nem sempre dominam o inglês o suficiente para o idioma estrangeiro interferir no português. Em segundo lugar, o português brasileiro apresenta uma variedade de gerúndios - e o inglês não. Alguns exemplos: "Olha, está querendo chover!", "Não estou podendo tirar férias agora". Cabe observar também que os idiomas francês e alemão não têm gerúndios. É a presença no idioma de uma sentença como: "O plantonista está atendendo amanhã na parte da tarde" que serve como "ponte" para a realização de: "O plantonista vai estar atendendo amanhã na parte da tarde". Na verdade, ao lado de formações como o infinitivo conjugado ("para comprarmos"), a mesóclise ("dir-se-á") e o futuro do subjuntivo ("se ele der"), a presença de gerúndios contribui para diferenciar o português de todas as outras línguas. É como Zeca Pagodinho e caipirinha; só o Brasil tem.

Superinteressante, 2005.

2 de outubro de 2012

Frase, gramaticalidade e inteligibilidade



Dentro da liberdade de combinações que é própria da fala ou discurso – liberdade que permite a cada qual expressar seu pensamento de maneira pessoal, sem ter de repetir sempre, servilmente, frases já feitas, já estereotipadas – há certos limites impostos pela gramática, limites que impedem a invenção de uma nova língua cada vez que se fala.

Nossa liberdade de construir frases está, assim, condicionada a um mínimo de gramaticalidade – que não significa apenas nem necessariamente correção (há frases que, apesar de, até certo ponto, incorretas, são plenamente inteligíveis). Carentes da articulação sintática necessária, as palavras se atropelam, não fazem sentido – e, quando não há nenhum sentido possível, não há frase, mas apenas um ajuntamento de palavras.

GARCIA, Othon Moacyr. Comunicação em prosa moderna. São Paulo: Editora FGV, 2010.

O revisor e a calculadora



Revisores, redatores e escritores cometem erros, mas estes devem ser percebidos antes de o texto ser publicado.

No meu trabalho, recebo textos de matemática em que faço a revisão dos cálculos. Se tiver algum problema, aviso o autor para rever o cálculo.

Mas, infelizmente, em alguns sites, algumas contas bem complexas não são revistas. Veja um exemplo que vi:

Segundo os meus cálculos de subtração:

2012 - 2003 = 9

Então, não foram 12 anos, mas há nove anos que o historiador britânico veio ao Brasil. Por isso, é bom ter cuidado quando for revisar algum cálculo. Além de caneta, lápis, borracha, devemos ter também uma boa calculadora.